UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL DA BAHIA
MICROBIOLOGIA: NOÇÕES BÁSICAS - 2019/2
DOCENTE: Marcelo Ehlers Loureiro
DISCENTE: Yago Soares Fonseca
Bactéria Diplococo
Os Diplococos ou Diplococcus se apresentam como duas
células associadas geralmente esféricas. Como apresentado na figura
abaixo:
Figura 1. Bactéria Diplococo Fonte: Microbewiki |
Uma importante espécie de diplococo é a Neisseria meningitidis que é uma bactéria aeróbica, diplococóide,
gram-negativa, circundada por membrana externa composta por lipídios, proteínas
(OMP) e lipooligossacarídeos (LOS), geralmente encontrada na nasofaringe de
seres humanos (VAN DEUREN et al., 2000).
São de grande importância clínica pois causam meningite meningocócica, uma grave inflamação das membranas que
envolvem o cérebro. Frequentemente são encontradas em membranas mucosas humanas.
Introdução à Doença
Meningocócica
A doença meningocócica é uma doença contagiosa causada por
bactérias gram-negativas. O principal agente etiológico bacteriano de meningite
no Brasil é a Neisseria meningitidis ou
menigococo (ROSENSTEIN et al., 2001; ROCHA; COSTA; SILVA, 2019). É considerada
um problema de saúde pública devido, devido a sua alta incidência e alta taxa
de letalidade, com capacidade de causar surtos e epidemias (STRELOW; VIDAL,
2013; APICELLA, 2015).
Figura 2. Neisseria miningitidis Fonte: Microbewiki |
Os meningococos podem ou não possuir cápsula de natureza
polissacarídica, considerada um dos fatores de virulência importantes na
invasão ao hospedeiro por inibir a atividade bactericida mediada por
complemento (CAUGANT e MAIDEN, 2009). As Neisseria
meningitidis não capsuladas são classificadas como não-grupáveis e podem
ser encontradas em portadores assintomáticos em uma frequência de 10% a 35% na
população e raramente causam meningite meningocócica (CAUGANT e MAIDEN, 2009;
HARRISON et al., 2009; READ, 2014).
Os meningococos que possuem cápsula polissacarídica são
vistos, de modo geral, como patogênicos. É considerado microrganismo exigente,
devido ao seu crescimento especialmente em meio seletivo: ágar sangue ou ágar
chocolate, na forma de colônias acinzentadas, de aspecto translúcido e forma
convexa (FERNANDES, 2016). Apresenta uma membrana externa encapsulada, composta
por polissacarídeos e proteínas capazes de causar grandes danos ao hospedeiro,
uma vez que é resistente a fagocitose e lise celular realizada pelo sistema
complemento. A partir da cápsula polissacarídica do meningococo é possível classificá-lo
em sorogrupos (com base nas diferenças antigênicas na cápsula polissacarídica),
sorotipos (com base nas proteínas de classe 2 e 3 da membrana externa (PorB OMP)),
sorossubtipos (nas proteínas de classe 1 da membrana externa (PorA OMP)) e o
imunotipo pelos agrupamentos de LOS (CAUGANT, 1998).
São classificados em 12 sorogrupos sendo A, B, C, X, Y e W os
sorogrupos mais patogênicos, sugerindo a coexistência de mais fatores na
determinação da doença (MAIDEN, 2008; BRICKS, 2002; BRASIL, 2017). Os
Sorogrupos A, B e C causam 90% dos casos de meningite meningocócica, enquanto o
grupo B é responsável por aproximadamente metade destes (FUSCO; BLAKE; 1998;
PELTOLA, 1998).
As Neisseria
meningitidis também podem ser genotipadas pelo o método de Multilocus
Enzyme Electrophoresis (MLEE) que identifica linhagens virulentas, clones ou
complexos clonais, denominados Electrophoretic Type (ET) (MAIDEN
et al., 1998).
Embora a transferência horizontal de genes possa gerar
diversidade e tornar o meningococo mais adaptativo, acredita-se que esse
mecanismo esteja mais relacionado à conservação e à homogeneização do DNA
(DAVIDSEN e TONJUM, 2006; MAIDEN, 2008).
Na sua forma mais grave, níveis elevados de bactérias no
sangue chegam às meninges no cérebro e a níveis tão altos de citotoxicidade,
induzem inflamação das meninges e progressão da doença. As pessoas mais
susceptíveis a essa infecção são frequentemente imunocomprometidas, sofrendo de
várias condições clínicas (traumatismo craniano e doenças associadas a
imunossupressão tal como HIV). Outros adquirem a infecção através de gotículas,
troca de fluidos e contato direto com o portador, com período de incubação de
aproximadamente quatro dias, variando de dois a dez dias (BRASIL, 2017).
A maioria das pessoas possui imunidade adquirida à Neisséria meningitidis. As crianças
adquirem imunidade através de anticorpos maternos.
Portanto, as meningococemias são basicamente
determinadas por baixa resistência imunológica do hospedeiro. A partir dos 6
meses de idade as crianças estão particularmente susceptíveis ao meningococo,
porque a imunidade humoral cedida pela mãe se
desvanece.
Patogenia
A Neisseria meningitidis inicia o seu processo
infeccioso através da colonização da superfície das mucosas, intra ou sub epiteliais da
nasofaringe
e orofaringe e entra em contato com as células epiteliais (NASSIF, 1999). O
meningococo adere a receptores específicos nas células não-ciliadas da
nasofaringe e internalizam-se em vacúolos fagocíticos. Por serem bactérias
encapsuladas, são mais resistentes ao processo de fagocitose
e se acumulam em vacúolos fagocíticos das células epiteliais nasofaríngeas que
são liberadas nos espaços intercelulares (FERREIRÓS; GÓMEZ; CRIADO, 1998).
Figura 3: Fisiologia da meningite bacteriana
Fonte: Microbewiki
|
Após a colonização da nasofaringe, os
filamentos de pili emanam da superfície bacteriana e são considerados os
principais meios de adesão do meningococo, eles interagem com receptores das
células da mucosa e com um cofator proteico da membrana CD46 e dão início à endocitose
para invadir o sistema circulatório (NASSIF, 1999). Na corrente sanguínea, as
bactérias proliferam e se adaptam ao ambiente hospedeiro. As respostas clínicas
à infecção variam desde uma forma benigna até formas fatais extremas
(meningococemia) (FERREIRÓS; GÓMEZ; CRIADO, 1998). O sucesso dessa invasão
dependerá da resposta imunitária do hospedeiro, do potencial de disseminação e
virulência da bactéria (BRASIL, 2017).
O fator de virulência que facilita a
sobrevivência da Neisseria meningitidis na corrente sanguínea é a
sua cápsula polissacarídica que a protege contra a lise da bactéria pelo
complemento e da fagocitose pelos neutrófilos, células de Kupffer e macrófagos
do baço (NASSIF, 1999).
O meningococo, durante a multiplicação e
lise, pode liberar endotoxinas, as quais podem induzir a produção exacerbada e
a liberação de mediadores, como TNF e citocinas pró-inflamatórias, levando o
hospedeiro ao choque séptico (VAN DEUREN et al., 2000).
A passagem da Neisseria meningitidis
pela barreira hematoencefálica não é bem compreendida, mas acredita-se que se
dê pela via plexo coróide pelos capilares das meninges. O meningococo, uma vez
no espaço subaracnóide, multiplica-se rapidamente, ocorre um influxo de
neutrófilos e seus subprodutos contribuem para o surgimento de manifestações
clínicas de meningite (NASSIF, 1999; VAN DEUREN et al., 2000). O período de
incubação da doença meningocócica varia de dois a cinco dias, e frequentemente,
o início das manifestações no hospedeiro é súbito, atingindo seu auge em 24
horas (FOCACCIA, 2015).
Aspectos Clínicos
Ao entrar na corrente sanguínea, o
meningococo desencadeia diversas manifestações clínicas. O indivíduo pode apresentar
desde um quadro de bacteremia leve com episódio febril curto, até um quadro
mais intenso (VAN DEUREN et al., 2000). A evolução do quadro clínico vai
depender da endotoxina liberada pela bactéria, do estado imune do paciente e da
resposta à endotoxina (STEPHENS et al., 2007).
Nos casos de bacteremia leve, o paciente
apresenta quadro respiratório leve com evolução favorável; na meningococcemia
crônica temos uma infecção rara que pode durar de semanas a meses, apresentando
febre intermitente, artralgia e exantema maculopapular não específico; na
meningoencefalite o paciente apresenta nível de consciência comprometido com
sinais meníngeos e reflexos alterados (ausentes ou raramente hiperativos). Os
quadros clínicos mais frequentes são de meningite meningocócica com ou sem
meningococcemia, enquantoque o mais grave é a de meningococcemia sem meningite,
abrangendo 5 a 20% dos casos, com elevada letalidade (APICELLA, 2005; STEPHENS
et al., 2007).
Tratanento
O antibiótico de escolha para o tratamento é a penicilina G
cristalina ou ampicilina, geralmente é administrada por via venosa, durante 7 a
14 dias (MS, 2005). Quando houver suspeita de resistência à penicilina, as
drogas alternativas são: cefalosporinas de terceira geração, ampicilina ou
cloranfenicol. Estudos feitos em vários países, inclusive no Brasil, apontam
que a maioria das cepas de Neisseria meningitidis isoladas de pacientes com doença meningocócica é
suscetível aos antibióticos rotineiramente indicados para o tratamento e
profilaxia, porém, a prevalência de cepas com suscetibilidade reduzida a
penicilina tem apresentado uma tendência de aumento (HARRISON, 2009; GORLA et
al. 2011).
Prevenção
A
prevenção da doença meningocócia pode ser feita através de quimioprofilaxia e de vacinas. Com
relação a quimioprofilaxia, a droga de escolha é a rifampicina, a qual deve ser
administrada simultaneamente a todos os contatos próximos, no prazo de 48 horas
após a exposição à fonte de infecção. Uma alternativa de tratamento profilático
seria a ceftriaxona (HARRISON, 2006). Embora a quimioprofilaxia não assegure
efeito protetor absoluto (reduz 90-95% dos portadores) e prolongado, é
recomendada por ser essencial para evitar casos secundários entre pessoas que
tiveram contato com casos de DMI em situações não epidêmicas (MS, 2005).
Em
setembro de 2010, a vacina meningocócica C conjugada ao toxóide diftérico foi
introduzida na rotina de imunização para todo o Brasil, sendo destinada à
menores de um ano em duas doses aos 3 e 5 meses com reforço preferencialmente
entre 12 e 15 meses de idade e; nas crianças entre 12 e 23 meses em dose única.
A partir do ano seguinte, em 2011, a VCMC se restringiu somente a menores de um
ano e seu reforço. Em 2017, o esquema da VCMC foi alterado com a adição da
vacinação em dose única para adolescentes entre 12 e 13 anos de idade. Em 2018,
a atualização do calendário vacinal ampliou a faixa etária em adolescentes para
11 a 14 anos de idade.
Publicação
recente aponta que após três anos de sua introdução (2011 a 2013), verificouse
uma redução da incidência da DMI pelo meningococo C de 66% em menores de um ano
e 52% em crianças de 1 a 4 anos de idade no Brasil (DE MORAES et al., 2017).
As
estratégias de vacinação contra a DMI, seja em relação a população alvo ou o uso
intercalado e vacinações em massa e de rotina, ainda constituem grande desafio
tendo em vista que a DMI atinge não somente crianças, mas todos os grupos
etários e a versatilidade do agente etiológico com a substituição frequente dos
sorogrupos circulantes (COHN e HARRISON, 2013). Cabe, portanto, a cada país
determinar qual melhor estratégia de acordo com os fatores de risco,
comportamentos da DMI e sorogrupos circulantes (COHN e HARRISON, 2013).
Ecologia
A redução de ferro é uma parte necessária do metabolismo de Neisseria
meningitidis. Os seres humanos são o seu
principal reservatório a partir do qual o ferro heme, juntamente com outros
nutrientes no sangue, satisfaz as suas necessidades de crescimento. O resultado
disso é uma agregação de células do sangue - um sinal de infecção.
Figura 4. Propriedade do biofilme bacteriano Fonte: CVE |
Embora nem sempre, Lappann (2006) demonstrou que N.
meningitidis é capaz de formar comunidades de biofilme em um ambiente de fluxo
lento. Biofilmes fornecem resistência contra antibióticos, como a penicilina.
Tem sido especulado (mas ainda não comprovado) que a cápsula meningocócica
evoluiu para suportar a transmissão entre os hospedeiros da bactéria,
possivelmente por prevenção da dessecação durante a rota do aerossol (VIRJI, 1996).
No trabalho de Lappann (2006) também foi notado que dentro do
crescimento do biofilme, microcolônias foram formadas, possibilitadas pelas
subunidades do pilus do produto do gene pilE. No entanto, o contrário não é
verdade, pois a formação de biofilme não dependia de pili. Além disso, foi
mostrado que a formação de pili não era para o único propósito de formar micro
colônias. PilX, uma proteína do tipo IV pilus desempenha um papel importante na
formação de agregados semelhantes ao que acontece com os eritrócitos de um
hospedeiro.
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